terça-feira, 30 de março de 2010

teatro da paz em Belém d'Amazônia

Saudações de Belém da Amazônia paraense, a todos e todas da Paz:

os brasileiros devemos sempre nos vacinar contra o porque-me-ufanismo de priscas eras (sintoma de complexo de inferioridade mazombo). Todavia, a virada para o séc. XXI está trazendo à tona do ex-país do futuro, um outro país em marcha para consolidação da democracia popular e construção da paz aqui e alhures.

não existe almoço de graça nem parto sem dor: o que há é subsídio escondido na sonegação da mais valia e anestesia que adia a dita cuja que a parturiente queria driblar...

a paz não é invenção sem risco para aprendizes de feiticeiro... Se a teoria da Evolução estiver certa (eu creio que sim), a Paz é etapa superior da evolução da espécie humana... E aqui acredito também que a "mistura fina" de todas as raças da humanidade filha da animalidade, na mestiçagem ao deus dará sob o Cruzeiro do Sul; dá o "milagre" do país tropical abençoado por Deus e bonito por natureza...

se homem nenhum é uma ilha, muito menos o continente Brasil. Esta Belém brasileira aqui no Norte teve cristãos-novos como parteiros, mas no curso de 4 séculos (por necessidade e acaso) sobre o chão de genocídios tremendos e cativeiros de índios e negros, a "massagada árabe" e a "ralé" judia como disse em crônica memorável Carlinhos Oliveira suplicando à atriz Lucélia Santos, da novela "Escrava Isaura"; que não paternalizasse os índios e os negros pois que os brancos da terra somos todos "farinha do mesmo saco"...; em busca do jardim do Éden engendraram o Inferno Verde...

estamos prontos a inventar um novo Novo Mundo? Sim, estamos... Mas convém ter consciência de nossas raízes na Terra comum de todos homens e mulheres do mundo.

Aqui nesta Belém do grão Pará hemos de ser sempre semente da Paz universal surdida da guerra regional: metade oriunda da velhíssima Palestina, metade descendente da obstinada Judéia. Eis que o escaldo de velhas cabanagens ainda não esfriou nestas paragens verdes, onde árabes e judeus, com cristãos velhos; vivem em harmonia e até se casam entre si para curtir em horas vagas a ópera O Guarani, no "Theatro da Paz"...

não é legal? Honra ao mérito do Presidente Lula e justa paz em Israel e na Palestina.

domingo, 21 de março de 2010

carta aberta: S.O.S. Cultura Marajoara!

A seguir, razões históricas de natureza antropoética [merci, Edgar Morin; grãomestre da fraternidade latina e cidadão do mundo] e autodefesa territorial do estado de direito democrático brasileiro na Amazônia atlântica. Cujo escudo além do próprio delta-estuário do grande mar de água doce chamado "país das Amazonas" (Amazônia) -- "mare nostrum" equatorial --, é, naturalmente, o jus solis da monumenta ancestral manifesta na complexidade da antiga Cultura Marajoara, de 1500 anos de idade: "mounds builders" da opera do barro e do mistério dos começos do mundo amazônico.

Patrimônio arruinado por desleixo local e cumplicidade global. Alienado por dez réis de mel coado no próprio berço e exilado dentre festas acadêmicas ou contrabando em ricas coleções exóticas de propriedade exclusiva de grandes museus, no País e estrangeiro, que a pobre gente ribeirinha não viu nem ouviu falar... Todavia, por necessidade e acaso, a letra torta de um caboco morador sem eira nem beira da história inventa na filosofia da chuva e tenta agora dar conta tardia do recado dos antepassados.

Primeiro passo, sem ilusões, para uma caminhada talvez de mil léguas... Até ancorar no Araquiçaua [lugar mítico da saga do Bom Selvagem, porto do Sol na Terra sem males] ou renascimento futuro do tempo arqueológico do Arapari reconquistado [país do Cruzeiro do Sul, nosso Brasil pré-colombiano, resgatado no século XXI com as metas do Milênio da ONU].

Petição popular para efeito de responsabilidade socioambiental das nações civilizadas em compensação às pobres regiões da Terra historicamente espoliadas por suas próprias metrópoles e terceiros países imperiais. Tímida iniciativa da academia do peixe frito, pedido de socorro sob invocação do milagroso São Benedito da Praia ou Ossaim (orixá das plantas medicinais), patrimônio imaterial do Ver O Peso: abertura de processo de tombamento da Cultura Marajoara como símbolo magno nacional da cultura da República Federativa do Brasil brasileiro.

Arapari: continente do Cruzeiro do Sul

Durante as antigas navegações indígenas, a gente vinha de canoa a remo ou à vela de jupati -- sob força de vento e maré -- das ilhas do circum-Caribe a conquistar o Arapari (constelação do Cruzeiro), na Terra Firme (continente). A misteriosa palavra de origem astral se aplica a várias coisas na terra, inclusive a certas árvores de boa madeira subindo ao céu equatorial tal qual observatório astronômico. Em língua geral amazônica, a velha palavra tapuia quer dizer "pari do sol" (limite, cerca do dia). Clara astronomia das velhas navegações caraíbas em migração das Antilhas para as Guianas guiadas pelas estrelas em busca do continente Sul.

Era tempo do herói mítico Anakayuri, célebre cacique da legendária confederação do Oiapoque. O mundo se repartia, então, em ilhas e antilhas... Tudo um enorme arquipélago com a maior de todas as ilhas sendo a "grande oval insular" das Guianas (Raja Gabaglia). Na verdade, o sub-continente das Guianas. Do qual o mar do Caribe e o mar de água doce Pará, com todas suas mil e tantas ilhas -- Marajó ao meio -- se integram através da piscosa Corrente marítima das Guianas.

Por outra parte, depois de descer dos contrafortes dos Andes para o litoral meridional do Brasil vinham os tupis e guaranis em migrações guerreiras contra os avoengos Tamoios [tamuya / tapuya] conquistando, palmo a palmo, o dito país do Cruzeiro... Em demanda da utopia selvagem [Yby marãey, terra sem mal]. Assim, entre guerra e paz Norte-Sul, chegou o dia, no Nordeste, em que se enfrentaram pela primeira vez os primeiros conquistadores do Brasil.

O tremendão Tupinambá, de longe o mais valente e aguerrido; empurrou os Jê-Tapuias para o planalto central e fez recuar os aruaques para as Ilhas do Pará, velha Tapuya tetama [Tapuirama, terra Tapuia]. Até aí o tempo antropoético pré-Amazônico, o qual continua até nossos dias coexistente à invenção da Amazônia.

tesouro escondido na foz do rio-mar

Face à crise global-urbana existe chance para enjambrar uma filosofia "amazônica" na constelação de outras regiões de culturas orgânicas "primitivas" ultrajadas pela desmedida arrogância da Civilização? Que pensar, por exemplo, do enigma da incomparável arte primeva da Amazaônia pré-colombiana pisoteada por numerosos e infelizes Planos de Desenvolvimento? 1500 anos contemplam a imensa solidão dos campos da ilha grande do Marajó. Velha Cultura ilhada, abandonada e deixada aos búfalos entre chuvas e esquecimento.. Aí, entretanto, um filósofo humanista e naturalista acharia talvez o elo perdido na passagem do homem natural ao homem lúdico: inventor de cultura "primitiva", engenheiro de aldeias suspensas sobre tesos (colinas artificiais) feitos de barro dos começos do mundo com a lição dos peixes do mato filhos da Cobragrande.

O que isto tem a dizer ao mundo industrial supertecnizado de nossos dias? Por necessidade e acaso, este tesouro da humanidade foi encontrado na foz do maior rio do "planeta Água", no dia 20 de novembro de 1756, informa o naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira, célebre autor da monumental "Viagem Philosophica" (1783-1792), na separata "Notícia Histórica da Ilha Grande de Joannes, ou Marajó"(1783).

Refere-se à inspeção que o capitão Florentino da Silveira Frade, sesmeiro da fazenda Ananatuba e fundador da freguesia de N.S. da Conceição da Cachoeira do rio Arari (1747) realizou a serviço do capitão-general e governador do Grão-Pará e Maranhão [Amazônia portuguesa] Francisco Xavier de Mendonça Furtado; diligência prévia para extinção da Capitania hereditária dos barões da Ilha Grande de Joanes (1665-1757) e sequestro das fazendas de gado da Companhia de Jesus na ilha do Marajó (1757). Convém recordar o histórico de luta e resistência das nações indígenas da "Ilha dos Nheengaíbas" [Marajó], que com exceção do comércio de escambo com feitorias holandesas no Amazonas para fins e troca de missangas por gados do rio, nunca aceitaram ocupação estrangeira nenhuma.

Por último, uma confederação de caciques Nheengaíbas [Anajá, Aruã, Camboca, Guaianá, Mapuá, Mamaianá, Pixi-Pixi e outras etnias] tendo à frente o ladino Piié Mapuá aceitou negociar a paz com o célebre payaçu (padre grande) Antônio Vieira. Acordo concluido pela instalação da missão jesuítica das aldeias de Aricará [Melgaço] e Aracaru [Portel] com índios descidos da aldeia do rio Mapuá [Breves], ano de 1659.

Mesmo assim, apesar da primeira explusão dos Jesuítas (1661) com Vieira em desgraça na corte e entregue ao tribunal do Santo Ofício; mais a doação da pacificada ilha dos Nheengaíbas para dar lugar à Capitania hereditária da Ilha Grande de Joanes (1665) ao secretário de estado Antônio de Sousa de Macedo, por el-rei dom Afonso VI; a ilha do Marajó permaneceu fechada ao colonizador até 1680, quando Francisco Rodrigues Pereira meteu a cara diante ao "perigo dos índios bravios [Aruãs], desertores e escravos fugidos" que existiam nos centros daquela cobiçada ilha, "maior do que o reino de Portugal". Os ditos centros, povoados de índios guerreiros e quilombolas valentes; guardaram o segredo dos tesos do Pacoval do Arari e do rio dos Camutins [urnas funerárias de cerâmica marajoara] por mais um século...

Desde então, com o Diretório dos Índios (1757) e expulsão dos padres (1759), a paz das grandes matriarcas e caciques mortos foi quebrada no alto das necrópoles e antigas aldeias suspensas. Dormiam em silêncio há milhares de anos sobre campos alagados e no secreto recesso de "ilhas" de mata em meios às campinas. Expostos à ignara curiosidade e avidez dos "civilizados", os tesos (sítios arqueológicos) não cessaram nunca de ser arrombados e saqueados na famosa casa da mãe Joana como atesta o Barão de Marajó em seu livro clássico "As regiões amazônicas" do fim do século XIX. Até restar, apesar do aviso da diretora do Museu Nacional, Heloisa Alberto Torres (cf. revista do SPHAN, 1937] no estado lastimável de ruína em que hoje se encontra.

deixem de besteira: venha a nós a Armada Brasileira!

Noves fora a mina de estudos acadêmicos, simpósios e cursos recheados de hipóteses e teorias sobre o homem amazônico para honra de grandes museus e centros de pesquisa sem cheiro de povo, a criaturada grande de Dalcídio Jurandir (populações tradicionais) não pesca nada do assunto. Desta maneira, a ancestral Cultura Marajoara poderia ser o muro das lamentações do Povo Brasileiro se, pelo menos, este tivesse oficialmente amparado o nosso Museu do Marajó como plataforma para educação patrimonial. Coisa que a gente precisa, no sentido de empoderamento de um legítimo e soberano desenvolvimento nacional.

É verdade que São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro ficam distantes do rio Amazonas. Mas, políticamente falando, embora habitando a mesma paisagem cultural Belém do Pará não fica mais perto do Marajó nem tem maior interesse acadêmico neste assunto de preservação da velha Cultura Marajoara do que as ditas metrópoles. Pesquisa expedita comprovaria o que se vem de dizer. E assim se explica a tragédia de fundo no apartheid etnicossocial da Cabanagem (guerra-civil de 1835-1840) e a síndrome evasiva da "cobiça estrangeira"...

Por incrível que pareça, sem muita verba nem verbo o Projeto "Nossa Várzea" de regularização fundiária de terras de marinha, da SPU; já fez mais pelas populações tradicionais das ilhas no sentido de recuperar sua identidade territorial do que os grandes sistemas nacionais de Educação e Cultura juntos. Pois, sabem lá os ribeirinhos da vida do que se está falando? A bacia geocultural Anajás-Arari (polígono de sítios arqueológicos) depois de ter sido berço de uma civilização neotropical deu espaço a lugar de chorar miséria frente a monumentos naturais das nações indígenas da América do Sol, desgraçadamente extintas sob a genocida colonização das terras baixas do trópico úmido sul-americano.

Oxalá, o Brasil democrático decida vir instalar a II Frota verde-amarela na antiga aldeia dos guerreiros Aruãs! A velha etnia senhora das armas das Ilhas, provavel causa do nome "marajó" dado pelo inimigo hereditário Tupinambá em reconhecimento à invencível resistência marajoara. Gente que foi obrigada pelo poder colonial a trocar de nome para "Chaves" importada do velho Portugal a mando do Marquês de Pombal.

Junto com as armas nacionais a oceonografia equatorial e a hidrologia amazônica poderia se desenvolver com a particicipação estratégica daquelas antigas populações marginalizadas. Segundo o fundador do Museu Paraense Emilio Goeldi, Domingos Soares Ferreira Penna, chamavam os Aruãs à sua ilha grande "Analau Yohynkaku"... Mas, os Aruãs não chegaram antes de 1300, dizem os arqueólogos. E já a célebre Cultura Marajoara existe desde o ano 400 enquanto se acham vestígios paleolíticos de 5 mil anos AC e de 9 mil AC em toda a Amazônia...

Então nós não estamos sendo vítimas de um surto de exaltado bairrismo, mas falando da PRIMEIRA CULTURA COMPLEXA DA AMAZÔNIA. Ou seja, do mais antigo Cacicado em região amazônica. Só depois vieram as culturas complexas Tapajós, Maraka e outras menos notáveis, todavia todas importantíssimas para Amazonizar o nosso Brasil brasileiro e sua descolonização total e final após 500 e tontos anos... Lembrando ainda que, provavelmente, foram aruãs as primeiras vítimas de escravidão atacados pelos hispânicos na América do Sul [cf. Nelson Papavero et al. em "O Novo Éden": MPEG, Belém, 2002].

Daí que além de aspectos puramente técnicos-militares a defesa do Estado-Nação envolvendo a criação da II Frota brasileira; há que se ater também a importantes aspectos históricos-geopolíticos capaz de mobilizar a sociedade civil com seus poderosos símbolos de territorialidade e profundas motivações antropológicas subjacentes à invenção da Amazônia debaixo da União Ibérica (1580-1640) e posterior integração ao Estado do Maranhão e Grão-Pará, ocorrida de fato em Marajó na "Pacificação dos Nheengaíbas" (rio dos Mapuá, 1659), lenta transição para a Adesão do Pará à independência do Brasil (Muaná, 28 de Maio de 1823).

Se tudo isto não bastasse para empoderamento democrático pelo Povo Brasileiro da sua Amazônia ancestral, talvez fosse preciso reavivar a memória da construção dos direitos que levaram no plano internacional ao reconhecimento do Mar Territorial brasileiro e definição da Lateral Marítima Norte: onde, sem nenhuma dúvida, conhecimentos de velhos marinheiros e pescadores tradicionais ostentam antiguidade incontestável que se reporta à Casa das Canoas e sua história oral memorizada na cultura popular. Então, o patrimônio imaterial revoluciona o campo do direito e dá sustentabilidade ao "uti possidetis" real de 1750 sob prisma novo, posto que tardio. No qual se ancoram os Direitos Humanos dos Povos Indígenas... Curiosamente, malgrado nossa imperial historiografia chapa-branca!

dando cabo à apartação histórica

Qual o problema da História do Brasil? O descobrimento tardio [através da Constituição de 1988] de que o Índio e o Negro, de direito e de fato, fazem parte da Nação...Não somos um "jovem país" de apenas 500 anos, mas uma velha federação de 1500 anos, pelo menos. Prova da Cultura Marajoara, o primeiro cacicado da Amazônia. Todavia, a partir do momento que a nação brasileira se levanta em defesa soberana da nossa Amazônia a intelligentsia tupiniquim há de despertar e filosofar sobre a amazonidade profunda e a monumenta marajoara assume paternidade da civilização autóctone brasileira.

Claro está que nosso patrimônio cultural imaterial inclui o tempo arqueológico, cujos primórdios se escondem no mito da Primeira Noite do Mundo dentro de um "caroço de tucumã" (Astrocarium vulgare) nos campos de Cachoeira do rio Arari... Como em toda outra periferia da Periferia do processo imperial do Ocidente, na Amazônia o estado precede historicamente à sociedade: regra geral do Novo Mundo.

Então a elite colonizada esbarra em outro preconceito, além do complexo de inferioridade mazomba: a suposta inferioridade do barro "pré-histórico" em relação à pedra pré-colombiana com que o Brasil ficaria irremediavelmente atrás da arquitetura Maya, Asteca e Inca... Esquecemo-nos de que sem a resistência relativa do barro ao calor da decolagem de foguetes não poderia a Terra sonhar ainda na conquista do espaço e ocupação da Lua... Se não dá para levar a ilha do Marajó como navio encantado a reboque de Cobra Norato ao Rio de Janeiro, façamos com que Brasília mande a Marinha do Brasil zelar pelo tesouro de biodiversidade e diversidade cultural que a Ilha do Marajó representa na condição de jóia da coroa na cultura nacional.

Cultura Marajoara, símbolo ancestral do Brasil

Logo, a boa filosofia não pode ignorar o papel histórico da mitologia ou da fé das religiões reveladas na arquitetura das civilizações; também na era global mito e história são inseparáveis como o homem e sua sombra. Não deve fechar os olhos a acontecimentos derivados do passado remoto. No extremo-ocidente na América, caimos na mesma armadilha que o velho Nilo arquitetou em pedra no antigo Egito, com imagem no monumento da Esfinge. Não nos damos conta de que tínhamos uma civilização orgânica, dávida do poderoso Amazonas que Herodoto jamais sonhou...

Chegou a hora do Brasil resgatar a monumenta Marajoara, fazer dela símbolo maior da cultura brasileira recuperada das suas assombrações coloniais depois que a "esperança venceu o medo". Os cabocos marajoaras manifestamos a amazônidade primeva, herdada de nossos ancestrais desde mil anos antes da conquista do "rio das Amazonas". Aos antepassados tapuia o maior rio da Terra era, simplesmente, "O Rio":

"GUIENA - Toponímia histórica do rio Amazonas, sob cuja forma aparece no Tratado de Santo Ildefonso, de 1777, no artigo XI, além de ser citado em vários autores que trataram da história do grande rio.
Étimo: do aruaco 'uêni', água, rio.
Bibliografia: Tavera-Acosta, "Rionegro", 32; Levy Cardooso, "Glossários", 98.
[ver "Toponímia Brasílica", Armando Levy Cardoso", Biblioteca do Exército Editora: Rio de Janeiro, 1961, 389].

Como os senhores professores deste país sabem, o Tratado de Santo Ildefonso é âncora dos direitos territoriais do Brasil, triunfo diplomático da tese de "uti possidetis" real defendida pelo santista Alexandre de Gusmão nas negociações do Tratado de Madrí (1750) e que fez jurisprudência no campo do direito internacional.

O que poucos sabem é que a palavra indígena "guiuêne" [água], na multidão de línguas amazônicas de tronco Aruak teve registro num texto político internacional, como se fora salva do dilúvio por milagre no afâ de deslindar a geografia colonial com a história viva das populações tradicionais; quando já a singular Cultura Marajoara havia atingido o apogeu para morrer e ressucitar no tempo arqueológico. Prova da antiguidade da civilização amazônica que não pára de causar admiração e suscitar novas experiências, como bem demonstra a arqueóloga Denise Pahl Schaan em seu importante compêndio "Cultura Marajoara", publicado pela editora SENAC, São Paulo (2010). Depois da obra de Schaan (ver www.marajoara.com ) não haverá mais álibi capaz de inocentar a intelligentsia tupiniquim e os políticos brasileiros da grave omissão histórica em questão.

domingo, 7 de março de 2010

pra não dizer que não se falou do tempo e da chuva

..."nós somos de Ponta de Pedras, na ilha do Marajó /
onde se faz sucesso de carimbó."

É carimbó pra lá, é carimbó pra cá... Mas da ancestral e arruinada Cultura Marajoara de 1500 e 'tontos" anos de idade praticamente não se fala nada que, de fato, interesse diretamente ao povo. A pobrezinha gente marajoara velha de querras perdidas, cercada de "mui" amigos por todos os lados, mormente em tempo de caça ao voto popular (noves fora quando o lero rende bolsas, cursos e carreiras de elite, com honrosa exceção do incrível "museu do Gallo", na antiga freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Cachoeira do rio Arari, datando dos idos de 1747).

Do ano de 1937 até 2010 duas publicações emblemáticas atiçam a curiosidade do leitor leigo sobre a estranha situação do patrimônio arqueológico brasileiro com relação às ruínas do tempo na ilha do Marajó. Posto que é impossível a verdadeiros pesquisadores desconhecer o assunto em tela, a gente ilhada dos sítios não alcança a letra dos livros e muito menos letras de câmbio do comércio de produtos com matéria prima extraída da Amazônia. A gente não sabe de livro nenhum, sobretudo porque mais da metade da população é analfabera de pai e mãe...

Vai daí que o finado padre Giovanni Gallo (ver www.museudomarajo.com.br ), da ilhada paróquia de vaqueiros e pescadores da Santa Cruz do lago Arari; inventou a estúrdia leitura de um museu ecológico e popular com a "ponta dos dedos" em "computadores" artesanais de pau e corda... Imagine!

A cega elite de Belém do grão Pará e outras capitais do Brasil gigante (com exceções de praxe) nem assim abriu os olhos às acuradas investigação de arqueólogos estrangeiros desde a exposição etnológica de Chicago (EUA), fins do século XIX, sobre a origem do homem americano. Quando se teve notícia das primeiras extrações de cerâmica marajoara para fins cientìficos, levadas do teso do Pacoval; o mais saqueado de todos. A criativa escrita "braile" do vigário de Santa Cruz do Arari para fazer educação patrimonial do povo não serviu, entretanto, aos acadêmicos para compreender o elo perdido entre "índios" e "caboclos" inventados pelos coloniais na injusta divisão do trabalho no Trópico Úmido do planeta Água. Nunca os doutores entenderam o recado do tempo arqueológico que o jesuíta traduziu, com simplicidade e dedicação, numa vida inteira até enterrar os próprios ossos no teso à ilharga do museu. Tal qual os marajoaras antigos ficavam enterrados ao fim da vida junto à aldeia em riba dos tesos (sítios com necrópole sobre aterros artificiais). Coisa extraordinária! Apenas os búfalos da maior ilha fluviomarinha do mundo e a sonâmbula sociedade nacional encantada com o primeiro mundo podem alegar que não sabiam nada destes acontecimentos do extremo-norte brasileiro.

Claro, em apenas 8 anos da era Lula lá nas cabeceiras do Planalto não se poderia mesmo zerar o passivo de mais de 80 anos, pelo menos, de neocolonialismo bandeirante na vasta Planície amazônica. Todavia, agora que nós entramos na reta final do segundo mandato popular da República federativa dos trabalhadores do país do pau-brasil é preciso marcar o terreno conquistado e balizar o rumo de futura jornada sem deixar perder a reconquista do passado. Para que não haja retrocesso da abolição do antigo apartheid, em nenhuma hipótese. Quem anda pra trás é caranguejo... Por isto, nossos antepassados indígenas quando queriam barrar a invasão do território deixavam no caminho caranguejos flechados como forma de dizer ao forasteiro: não prossiga na invasão de nossa terra sagrada...

Do mesmo modo, os cabocos agora devemos assinalar o chão da história de nossos dias para informar a eventuais conquistadores do alheio que devem respeitar os limites do espaço da cultura ancestral e estancar a destruição do tempo arqueológico, imediatamente!

A primeira obra informativa de caráter nacional sobre a destruição acelerada da antiga cultura marajoara é de autoria de Heloísa Alberto Torres, diretora do Museu Nacional (Rio de Janeiro) [in revista do SPHAN de 1937] e a mais recente é a "Cultura Marajoara" (ed. Senac-SP, 2010) da arqueóloga brasileira, nascida no Rio Grande do Sul, Denise Pahl Schaan. Ambas autoras nos falam da extraordinária importância deste patrimônio da humanidade debaixo da responsabilidade soberna do Brasil e do drama da sua preservação e democratização cultural.

Entretanto, já no final do século XIX o Barão de Marajó havia dado sua penada de protesto aos saques dos tesos para levar cerâmicas em contrabando. A primeira "Notícia da Ilha Grande de Joannes", de autor anônimo da metade do século XVIII, fala do sítio do Pacoval do rio Arari. E o naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira, na "Notícia Histórica da Ilha Grande de Joanes, ou Marajó" (1783) informa que o dito teso do Pacoval foi descoberto pelo inspetor da ilha, capitão Florentino da Silveira Frade, em 20 de novembro de 1756... Por acaso 20 de novembro viria ser depois data da Consciência Negra e aqui estamos nós a falar da leseira amazônica, da ilha onde Vicente Pinzon (em 1500, cerca de dois meses antes de Cabral chegar a Porto Seguro) atacou aldeia do Marajó e escravizou 36 índios, os primeiros "negros da terra" -- escravos indígenas -- da América do Sul, digo do Sol...

O diabo é que os "brancos" não sabem ler escrita de índios, pretos velhos e cabocos. Reciprocamente estes últimos nunca chegaram a compreender direito língua de branco... Então, as coisas chegaram a este ponto, inclusive a tal Mudança climática... que Deus nos livre a todos!

Por diretas contas o relato de dona Heloisa somado ao da gaúcha-marajoara Denise Schaan é parte substancial da crônica de um desastre emblemático, uma formidável destruição natural do tempo e covardia moral misturada à ignorância dos homens de nossa época dentro e fora do País. Para a brava gente marajoara, expressamente nominada na Constituição do Estado do Pará de 1989, no art. 13, VI, parágrafo 2º; foram 73 anos anos de soluços e silêncio entre chuvas e esquecimento.

Por estranha coincidência, a idade do caboco escrivinhador. Destes tantos outubros de solidão tenho dedicado esforço a romper o silêncio a golpes de pajé pra chatear a consciência dos outros sobre o tema ingrato, pelo menos, nos últimos 15 anos, desde o derradeiro "Encontro em Defesa do Marajó" realizado entre os dias 28 e 30 de abril de 1995, em Belém e Ponta de Pedras, organizado pelo GDM. Confesso que estou fatigado, mas desanimado nunca.

O certo é que sem sociedade civil organizada e vontade política dos nobres representantes do povo, a brava gente não pode querer! Não pode pois não lhe deixam margem à verdadeira expressão desde a extinção da babel do rio das amazonas, que deu no famigerado Diretório dos Índios (1757).

Ao fazer balanço de perdas e ganhos em 21 anos (idade da maioridade) da Constituição-Cidadã, a gente ribeirinha (órfa de Dalcídio Jurandir e Giovanni Gallo como já estava, e por último desfalcada do camarada Neuton Miranda recentemente falecido em plena lida) chegamos a compreender que muitas malfeitorias ficaram para trás. Mas seria triste dormir sobre os pingues louros da vitória depois que a "esperança venceu o medo". A pletora de audiências públicas e as sabidas demandas de lideranças populares face ao invencível iluminismo das chamadas "classes dirigentes" revela que o escambo de miçangas por mão de obra vulgar e matéria-prima continua de vento em popa como, paresque, há 300 e tontos anos... O que a gente tem de saber é do direito de primogenitude da Cultura Marajoara,como arte primeva amazônica; que não deve ser trocada por um prato de lentilhas...

O sentido de uma demanda símbólica fundamental como o tombamento da Cultura Marajoara pré-colombiana, sim, isto será a mais valia do desenvolvimento humano na Amazônia, periferia da Periferia; antes que prospere entre nós, irremediavelmente, a tese burlesca de que o Búfalo é o simbolo da nossa cultura marajoara! O que se está abordando é da âncora da Amazônia sustentável.

Há que se lutar ainda, mais uma vez, com as armas que houver à mão: ontem, para evitar a invasão e perdimento total das ilhas, usamos zarabatana e setas envenadas de curare (vem daí talvez o apelido posto pelo inimigo valente, o tremendão Tupinambá treme terra; de "marãyu / marajó", gente malvada... (nada a ver com "barreira do mar", acredito). Depois de infinita vexação aos brios deste povo, com facão e espingarda às mãos deu-se a terrível Cabanagem (1835-1840, mais ou menos, com 40% da população amazônica, de 100 mil almas, mortas na guerra-civil que o Brasil esqueceu...). Hoje na Democracia brasileira a participação popular é nosso escudo...

Que esta nossa gente diria, enfim, se tivesse voz e vez de fato? Talvez, que tendo ela "saído do mato" e sobrevivido no dito mato sem cachorro há de querer as poderosas armas da Educação, Ciência e Cultura tecnológica... Que todas aquelas grandes cidades, do Brasil e do mundo, com seus luzidos museus aonde a cerâmica marajoara foi parar (não importa como) façam-nos a gentileza de passar "recibo" sob forma de compensação ou intercâmbio visando à melhoria do IDH das mais de 500 comunidades locais espalhadas entre ilhas e a terra-firme nos 16 municípios do arquipélago e mesorregião.