quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

desenvolvimento das populações tradicionais

Por certo pouca gente compreende o que a arqueologia e antropologia, em torno de uma instituição como o Museu do Marajó, tem a ver com programas de inclusão social e proteção ambiental através do turismo. Sobretudo o que tudo isto poderia servir em benefício das populações tradicionais ribeirinhas.

A sociedade brasileira desconhece praticamente o fato de que o golfão marajoara, compartilhado pelos estados do Amapá e Pará na foz do rio Amazonas, reúne um arquipélago de extensão territórial maior do que um país como Portugal, por exemplo, e população equivalente a do vizinho Suriname. Mais de meio milhar de comunidades ribeirinhas habitam este enorme arquipélago marítimofluvial, no qual a célebre ilha do Marajó (com 12 municípios), tendo quase 50 mil km² de extensão, é maior do que a Holanda.

Ora, se apenas Marajó justificaria uma política especial focada nas populações tradicionais; o Amapá e Pará com suas costas marítimas da Amazônia azul e o interior com os povos da floresta e margens de rios e lagos oferecem vasto panorama geográfico que requer atenção. Não se deve confundir a afirmação que fazemos sobre a Cultura Marajoara como se a mesma fosse a única ou a melhor de todas mais (Tapajônica, Maraka e outras). Com base nas mais recentes pesquisas, todavia, sabe-se agora que a primeira cultura complexa (cacicado)da Amazônia teve início na ilha do Marajó, cerca do anos 400 da era cristã e cujo apogeu deu-se, aproximadamente, pelo ano de 1300 com o florescimento do que se pode considerar arte primeva do Brasil. Da qual peças e coleções se acham em mais de 10 grandes museus internacionais e brasileiros.

O problema que se apresenta é o empoderamento desta herança pelos descendentes daqueles povos originais. Portanto, uma política de desenvolvimento regional integrada. No caso do Estado do Pará isto encerra aspecto estratégico. Deste modo, o Pará poderia exercer papel de liderança no sentido do Brasil se assumir, de direito e de fato, como o maior país amazônico do mundo!

É fato que as populações tradicionais, em todo mundo, são tratadas com paternalismo e de modo apenas acessório nas políticas públicas de todos países no plano do discurso "politicamente correto" frente a eventuais pressões internacionais nem sempre honestas e bem informadas. Mas, vai longe o tempo do heroísmo positivista do nosso invulgar Marechal Rondón: os "nossos" Índios, Quilombolas e Cabocos graças à própria resistência invencível dos PRIMEIROS POVOS DO BRASIL e o progresso da Cidadania já dispõem de líderes de grande capacidade de articulação e compreensão da sociedade nacional e do sistema internacional.

Entretanto, a sociedade regional revela considerável retardo em relação aos mais recentes acontecimentos políticos e socioambientais do país e da região. Esta "periferia da Periferia" (Amazônia) pode ser "centro" mundial de cooperação federativa e internacional para o enfrentamento da MUDANÇA CLIMÁTICA e inovação tecnológica em vista de um novo paradígma de produção e consumo. Ou seja, a inclusão socioambiental das populações tradicionais não é bondade do sistema mundial. Na verdade é questão de sobrevivência da humanidade em harmonia com a segurança local e desenvolvimento nacional soberano e solidário.

No quadro geopolítico da Pan-Amazônia [Amazônias brasileira, boliviana, peruana, equatoriana, colombiana, venezuelana, guianense, surinamense e franco-guianense)o Pará vira a primeira década do século XXI em boas perspectivas de desenvolvimento. Infelizmente, padece de falta de interlocutores à altura do desafio e da oportunidade histórica. Não se improvisa interlocutor para uma unidade-chave do sistema federativo como este e não basta a maior parte dos eleitores eleger uma figura para governar o Estado...

temos o exemplo de um intendente de Belém como foi o conservador Antônio Lemos ou o Interventor liberal Magalhães Barata para "encarnar" o espírito da amazônidade perante a Pátria e o mundo a fim de ilustrar a tese que estamos debuxando aqui.

Claro, no século XXI "caciques" não tem mais futuro... Agora em vez de déspotas esclarecidos é preciso líderes tais como Lula, capazes de aglutinar em torno de si as maiores inteligências engajadas com um projeto de Estado Democrático e sentido de mundo, porém com cara e jeito de Povo.

Eu sou um desta gente das ilhas que ainda tem pela Cidade grande de Belém em grande conta: para mim a academia do peixe frito (Ver o Peso) além de lugar de trocas é PATRIMÔNIO IMATERIAL da paisagem cultural...

Por isto, um prefeito de Belém com a estatura histórica de um Antônio Lemos ou perfil de um Jacques Chirac que encarnou a cidade de Paris para empolgar a presidência da República é o modelo de interlocutor a que me refiro. Embora num caso e outro a posição de direita dos personagens não me agrade nem um pouco. Todavia, não é porque alguém se pinta de "esquerda" que eu acredite que é o cara talhado ao papel que aqui vamos desenhando.

Com isto quero dizer que dos personagens em cena não vemos ninguém à altura do necessário. Que, portanto, ainda vamos "comer muita farinha" para ter lideranças como é preciso a fim de:

(1) EVITAR A DIVISÃO DO PARÁ antes de, pelo menos, 2020 (claro que os Estados do Tapajós e de Carajás serão realidade no devido tempo, de modo que a Amazônia saia maior e o Pará não fique menor em sua importância socioeconômica e histórica, como o Grão-Pará de sempre, "do Brasil sentinela do Norte"...);

(2) REALIZAR O VATICÍNIO DE HENRI COUDREAU (ver "O futuro da capital do Pará", Imprensa Oficial do Estado: Belém, 2002)e análise de Eidorfe Moreira, "Belém e sua expressão geográfica";

(3) O VER O PESO COMO CORAÇÃO DA PAISAGEM CULTURAL, reconhecida pela UNESCO, integrando o rio e a rua, a Cidade e as ilhas... A burguesia e as classes trabalhadoras, a tradição e a modernidade... Sem dúvida, uma utopia do século XXI (justa e perfeita).

Quem não acredita em Utopia não é nem será nunca político. No máximo poderá ser um bom gerente, mas os novos tempos exigem gerentes-intelectuais em lugar de tarefeiros e fazedores de coisas... Mirem-se no exemplo do sindicalista Lula da Silva, criticado de nunca ter operado um carrinho de cachorro-quente!!!

***
o tucanato com Almir Gabriel teve o mérito de investir no que ele chamava de 'paraensismo' revitalizando o patrimônio histórico da "belle époque". Jatene continou os investimentos anteriores visando, através do turismo, "vender" a paisagem cultural como fator econômico de geração de emprego e renda.

mas é bom refrescar a memória e lembrar que a PARATUR, como o extinto IDESP ressuscitado por Ana Júlia; foi colocada na lista dos órgãos públicos com pé na cova... Ironicamente, o médico Adenauer Góes (criticado por não saber nada de turismo)tirou a PARATUR do leito de morte e deu projeção internacional ao Pará com a FEIRA INTERNACIONAL DE TURISMO DA AMAZÔNIA (FITA) além de outras inciativas.

o que não se entendeu, então, é que o Turismo foi visto como um MEIO e não um fim em si mesmo, para tirar a "província" do Pará das suas saudades da "belle époque" da Borracha...

é lógico que a "expressão geográfica de Belém" é o grande atrativo e que Marajó faz parte desta emergente "paisagem cultural" com ambição de conquistar o título da UNESCO.

LOGO, sem o aval do Governo Federal nada se fará de sério neste sentido. Mas, sem acordo do Governo Estadual não dá nem pra conversar... E sem a parceria dos Municípios o discurso fica falando só...

PIOR: sem a efetiva participação da gente. Isto é, das POPULAÇÕES TRADICIONAIS resta apenas o larilari e o marquetingue, quen nem o vôo curto da galinha.

POR ISTO ATÉ HOJE, todavia, os tucanos do Pará não tiveram dos tucanos-açus de S.Paulo a mesma afeição que teve a Zona Franca de Manaus. Foi uma luta em vão a ligação de vôos internacionais a partir de Belém: deste modo, o custo de passagem e o tempo de viagem continuaram sendo enorme obstáculo para o turismo receptivo na AMAZÔNIA PARAENSE. E a política neoliberal dos tucanos reserva a parte do leão para companhias aéreas, bandeiras hoteleiras em resorts com turismo de massa.

as populações locais entram no negócio como meras prestadoras de mão de obra e as comunidades como figurantes tipo canoeiros e vendedoras de tapioquinha.

a inesperada eleição da candidata Ana Júlia quebrou o "encanto" tucano (por motivos sabidos que levaram à ruptura da amizade dos dois castanhalenses descendentes de imigrantes libaneses).

ainda não se estudou com profundidade a emergência na região dos chamados sírios-libaneses misturados correntemente a famílias sefarditas de judeus do Marrocos... O que a dupla Gabriel-Jatene poderia provocar.

evidentemente, o PT e aliados de esquerda não pareciam bastante motivados a crer que poderiam derrotar os tucanos no Pará. Portanto, não estavam preparados a governar do modo que seria necessário: ou seja, completar a política de REVITALIZAÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO e infra-estrutura por intensiva participação popular.

pode-se negar que não existe participação popular nas políticas públicas? Claro que existe participação...

mas qual é, exatamente, o alcance da parte que nos cabe neste latifúndio?

os tucanos erraram por não instituir pelo viés do Turismo de base comunitária uma COOPERAÇÃO INTERNACIONAL focada na OTCA. Mas o PT também errou ao improvisar a CIDS divorciada do eixo do turismo receptivo como pela mestra de um novo Pará com a cara paraense...

o que equivale a dizer a descolonização da antiga província madereira e minerária...

e foi aí que a leitura do Governo Popular sobre o legado de Almir Gabriel falhou...

Por ironia do destino, Ana Júlia e Almir Gabriel vieram a se unir contra Jatene: mas o caldo havia sido entornado antes - sempre em torno da figura incontornável do cacique Jader Barbalho - há algo que paira sobre todas cabeças pensantes deste estado rico de povo pobre...

a fazenda Pirelli, comprada pelo Estado à multinacional que falhou no cultivo da borracha; deu espaço ao projeto ecoturístico do PARQUE AMAZÔNIA (rifado sem maiores análises pelo staff da governadora Ana Júlia)...

era oportunidade para um TURISMO AMAZÔNICO diverso do feijão com arroz... Talvez o preconceito apressado por ter aí arquitetos norte-americanos (projeto premiado internacionalmente)resultou em autêntica pisada na bola...

pois o Guamá se integrava ao arquipélago do Marajó e toda orla do Guajará. Ou seja, ECOTURISMO DE BASE COMUNITÁRIA em vista; como só quem conhece bem o "case" Costa Rica... (e quanto $$$ isto pesa em divisa externa no PIB daquele país centro-americano) sabe do que estamos falando.

com a inclusão socioambiental da Populações Tradicionais via ECOTURISMO talvez a história do Pará fosse outra hoje.

Um comentário:

Rose disse...

Olá José Varella, gosto muito dos seus escritos sobre o nosso Marajó, nosso povo, cultura e história.
Aproveitando a oportunidade, gostaria de saber se vc sabe qual a data de fundação do farol Itaguari (entrada de Ponta de Pedras)?, pois estou fazendo uma pesquisa sobre ele e estou tendo dificuldade em obter esta informação.
Parabéns pelos belíssimos textos!!!!