quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

RESERVA DA BIOSFERA MARAJÓ PRA QUE TE QUERO?

Desde a era Vargas, planos de “valorização” e de “desenvolvimento” da Amazônia têm gerado mais destruição do meio ambiente e desvalorização da cultura das populações tradicionais, pobreza de muita gente e concentração de renda em mãos de poucos não exatamente filhos da terra; do que valorização e desenvolvimento propriamente ditos.

Prova de que o planejamento econômico e a decisão política para as regiões amazônicas ainda não encontrou a fórmula justa e perfeita do “desenvolvimento sustentável”, cantado em prosa e verso. Portanto, urge acertar a mão! Quem fizesse o prodígio mereceria prêmio Nobel.

Como seria possível acontecer algo assim socialmente justo, economicamente durável e ecologicamente sustentável em meio à louca corrida diante de fortes e contraditórias pressões para preservar e crescer infinitamente?

Existe consenso de que a saída é zoneamento ecológico-econômico estabelecido pelos estados com apoio da União levado a cabo pelos municípios. Até aí há acordo de princípio. Todavia, no campo da realidade a vaca vai para o brejo quando se constata que macro zoneamento serve para dar rumo, porém no detalhamento local a porca torce o rabo.

Relatório do Ministro-Chefe da Controladoria-Geral da União, Jorge Hage Sobrinho; sobre o descontrole dos municípios mostra, claramente, que o furo das políticas públicas é mais embaixo. Assim, não há Tribunal de Contas nem punição que dê jeito. Quem é punida é a sociedade em geral porque o resultado a má gestão local não se confina e vai estourar o orçamento da mais próxima cidade estuário da migração.

Por outra parte, mesmo quando há administração regular dos recursos sem zoneamento ecológico-econônico real dos municípios não existe produção, emprego e renda local sustentável: logo, é ficção a “autonomia” municipal que se baseia unicamente no fundo de participação de estados e municípios. Assim, macro zoneamento sem detalhamento a nível de execução local só serve para decorar parede de gabinetes e ilustrar workshop.

É no detalhamento local e no quadro funcional de prefeituras e câmaras de vereadores que o bicho pega. Começa aí que zoneamento ecológico-econômico implica regularização fundiária do território de acordo com o pacto federativo. Não existe desenvolvimento sustentável na bagunça e injustiça agrária.

É fácil em Brasília chegar a acordo sobre tudo isto aqui: difícil é fazer ordenamento territorial na vasta e mal conhecida Amazônia sem municípios bem equipados e preparados. Entretanto, existem regiões que podem ser selecionadas para formar consórcios intermunicipais e receber meios necessários a servir de laboratório e referência às mais regiões. Mas, quando apesar de tudo a coisa vai mal ou não se desenvolve como precisava é sinal de que a sociedade civil carece de ajuda extraordinária além do que se esperava: e, francamente, dar tratamento igual aos desiguais é uma irresponsabilidade política que o relatório Jorge Hage parece nos advertir.

A mais valia da Amazônia Marajoara

O realismo político ensina que o ótimo é inimigo do bom... E bom, neste caso, é não voltar atrás no “Plano Amazônia Sustentável” (PAS). Mudam-se ministros, cotas partidárias e governos; porém o Povo e a República não mudam.

Mal ou bem, com as falhas de sempre e falta de diálogo entre equipes ministeriais, secretarias estaduais e prefeituras inseriu-se no quadro geral do PAS o “Plano de Desenvolvimento Territorial Sustentável do Arquipélago do Marajó” (PLANO MARAJÓ) complementado e integrado pelo programa “Territórios da Cidadania – Marajó”.

Ora, se não fosse a fragilidade de representação das comunidades tradicionais ribeirinhas, não se verificaria a míngua de interesse acadêmico e apatia da mídia sobre o assunto. O Brasil e o mundo já saberiam que sob estes rótulos burocráticos se esconde uma demanda histórica no bojo de mais de 200 ações programáticas, com destaque para o “projeto Nossa Várzea” de regularização fundiária de terras da União, em favor de comunidades tradicionais ribeirinhas e a criação da reserva da biosfera do arquipélago do Marajó.

É claro que o possível reconhecimento internacional da área de proteção ambiental de que, expressamente, trata a Constituição do Estado do Pará (§ 2º,VI, art. 13) como reserva da biofera da rede mundial, do programa da UNESCO “O Homem e a Biosfera” (MaB); tiraria do isolamento e ostracismo o arquipélago do Marajó com sua população historicamente marginalizada.

A mais valia socioambiental do imenso delta-estuário do rio Amazonas, golfão da Amazônia Marajoara, onde as Amazônias azul e verde se unem inseparavelmente; desafia a imaginação criadora de economistas e políticos face à oportunidade do desenvolvimento regional sustentável em meio aos graves problemas globais da mudança climática.

A Constituição do Estado do Pará de 1989, em seu artigo 13, alínea VI, parágrago 2º, expressamente determina: “O arquipélago do Marajó é considerado área de proteção ambiental do Pará, devendo o Estado levar em consideração a vocação econômica da região, ao tomar decisões com vistas ao seu desenvolvimento e melhoria das condições de vida da gente marajoara”.

Entretanto, demorou mais de vinte anos para o Governo Estadual implementar medidas conseqüentes do dispositivo constitucional de modo a, efetivamente, implementar a APA-Marajó. Deste modo, atender à demanda popular de Muaná (08/10/2003) para reconhecimento pela UNESCO da reserva da biosfera do Arquipélago do Marajó. Ou seja, dar efetividade ao zoneamento ecológico-econômico da mesorregião em cooperação multilateral do programa MaB/UNESCO.

Não estamos falando de uma “ilha”, mas do singular bioma de encontro da corrente equatorial marítima do oceano Atlântico com a gigantesca correnteza fluvial amazônica. Da bacia formada por antigos estratos geológicos e depósitos de aluviões sobre a plataforma marítima; espaço do labirinto de terras baixas por onde o trabalho das marés e o rigoroso regime de chuvas fizeram o apogeu da biodiversidade aquática no novo trópico úmido.

Dia da Cultura Marajoara

Segundo a arqueologia, primitivas remoções de terra para manejo de estoque de peixe do mato a origem dos famosos tesos [mounds, aterros]da ilha do Marajó, dos quais o teso do Pacoval (bananal) do Arari, achado em 20 de novembro de 1756, pelo inspetor Florentino da Silveira Frade [apud Alexandre Rodrigues Ferreira, 1783], primeiro sítio arqueológico de cerâmica marajoara dentre todos mais que se tem conhecimento.


Argumento importante a favor do tombamento oficial da Cultura Marajoara no patrimônio nacional a par do reconhecimento internacional da Amazônia Marajoara, sob soberania do estado brasileiro do Dia da Cultura Marajoara. Fato que, certamente, suscitaria a consciência da sociedade sobre a biodiversidade e diversidade cultural da grande região estuarina amazônica e sua correlação com a biosfera planetária.


Amapá e Marajó, áreas do corredor das Guianas.

Com exceção da antiga costa-fronteira do Pará no litoral sudeste da ilha do Marajó entre a ponta do Maguari (Soure) e Itaguari (boca do rio Marajó-Açu, em Ponta de Pedras) polarizada por Belém; a maior parte da população ribeirinha tem origem na poeira de aldeias “nheengaíbas” (nuaruaques) oriunda das Guianas, através do Amapá.

Resulta que Marajó se apresenta como ilha excêntrica, literalmente. Posto que seu “centro” político e econômico está em Belém. Todavia, pela costa norte é Macapá que exerce atração de maneira definitiva e, através do Oiapoque, Caiena (Guiana francesa) e Paramaribo (Suriname).

O fato do bioma marajoara ser bem definido pelo arquipélago poderia inverter a pauta do MaB internacional para privilegiar a região amazônica, certamente, a mais significativa à inovação em integração e sinergia da Educação, da Ciência e da Cultura: eis que estamos nos referindo à primeira cultura complexa da Amazônia em um singular bioma marítimo e fluvial do Trópico Úmido notável pela ocorrência de manguezais e populações tradicionais que vivem, há milhares de anos, dos recursos naturais locais.

Mercado da cultura e do meio ambiente

O ano de 2011 começou com a boa notícia da homologação oficial do tombamento da cada do escritor Dalcídio Jurandir, em Cachoeira do Arari. Já a festividade de São Sebastião havia sido inscrita no patrimônio cultural imaterial, de modo que passo a passo Marajó vai encontrando o lugar que merece.


Marajó tem sido exemplo de desperdício econômico motivado por miopia política. É preciso que na virada para a segunda década do Século em vias do cumprimento das metas do Milênio (2015), esta “ilha” emblemática dê a volta por cima. E se existe um país no mundo no qual o Pará deveria se espelhar para planejar o desenvolvimento de suas regiões de potencial turístico esse país seria a Costa Rica, na América Central. Pontualmente, quais itens de uma agenda de desenvolvimento do Marajó?

• O IPEA com o IDESP dirão, expressamente, qual “vocação econômica da região” com vista a tomadas de decisão para “o seu desenvolvimento e melhoria das condições de vida da gente marajoara”.

• A RB do Arquipélago do Marajó não terá sentido, sem firme decisão de implantar conjuntamente a RB e corredor ecológico da Amazônia Central e levar adiante o corredor ecológico costeiro marítimo da Amazônia.

• Além disto, o verdadeiros desafio científico e tecnológico para geração de emprego e renda da população de modo a provar que o discurso do desenvolvimento sustentável não é uma miragem.

• De acordo com o calendário turístico e cultural do Pará, um grande Festival do Marajó, de apelo nacional e internacional, deverá ser estudado de maneira a produzir resultados socioambientais e econômicos mensuráveis.

• Os cinco sentidos marajoaras devem servir de escopo à criação do festival dos festivais dos municípios do Marajó: sabor, cheiro, visual, som e forma.

• A gastronomia, por exemplo, deve receber assistência técnica para poder oferecer degustação local da cozinha tradicional marajoara, mediante produtos naturais da fauna e da flora devidamente manejados, autorizados e certificados;

• Carne e queijo de búfala, por exemplo, poderá aproveitar o festival para promoção ao mercado nacional e externo como produto orgânico (verde).

• O ecoturismo de base na comunidade deve ser o elemento econômico principal do PLANO MARAJÓ: com isto se quer dizer que a produção das ilhas deve priorizar o consumo da população local e dos turistas, somente atendidas estas necessidades se há de pensar mercado regional e externo.

• Atualizar a leitura da determinação constitucional, significa – ainda que tardia – a libertação da brava gente marajoara depois de quatro séculos de escravidão e exploração humana.

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